THE MULTITASKING REPORT: SXSW 2023
Se você já se atentou a descrição dessa newsletter pode imaginar que atualmente nenhum evento ou trend bombada das redes sociais, no momento, pode me dar mais FOMO do que o SXSW.
Caso já tenha cansado de ler sobre o assunto, até te entendo, me desculpe, mas me interesso d+ sobre o evento pra deixar de falar nele por aqui.
Agora se você estava alienado nas últimas semanas e não sabe do que estou falando vou te explicar: O South by Southwest é um evento que iniciou em 1987 na cidade de Austin no Texas, inicialmente como um festival de música, que acabou ao longo do tempo adicionando cinema (inclusive o ganhador do oscar esse ano foi lançado adivinha aonde no ano passado?), e mais tarde tecnologia e inovação.
O SXSW acontece em março, início da primavera no hemisfério norte e gosto de pensar na poesia de acontecer nessa data fazendo a analogia de um momento em que a vida e portanto a criatividade aflora após o recolhimento durante as estações mais frias.
Romantismo a parte, foi no SXSW que grandes unicórnios que fazem parte do nosso dia a dia hoje foram lançados como Uber, Twitter e Airbnb, não é de se espantar então que o festival venha a cada ano ganhando mais importância e chamando a atenção de todo mundo que de alguma forma está interessado em observar novas tecnologias, comportamentos e inovações. Reunindo uma audiência diversificada mas certamente criativa e disruptiva.
Por 10 dias o festival ocorre pela cidade com palestras, pitches de startups, ativações de marcas, feira de inovações, apresentações artísticas, festivais musicais e mostras de filmes.
Esse ano em especial o festival voltou com força total, já que devido a pandemia aconteceu online nos últimos anos e ano passado ocorreu bem em meio a onda da variante omnicron que acabou por esvaziar o evento. Chama atenção também a enorme presença de brasileiros, sendo esta a maior delegação participante, só atrás obviamente da americana.
Acompanhei diversos brasileiros que tiveram a generosidade de compartilhar um pouco do evento nas suas redes e socias e acalmar indiretamente meu FOMO. Você pode imaginar que em um festival desse tamanho há muito conteúdo a consumir e muitos pontos de vista a avaliar e confesso que apesar de ter maratonado muito do conteúdo disponível daqueles que julguei mais interessantes ainda não finalizei completamente, portanto como queria muito escrever um relatório com a minha visão do que consumi e tendo em vista que na internet as pautas ficam ultrapassadas mais rápido do que as vezes conseguimos absorver e formar opinião decidi escrever o report (com toques pessoais) com as minhas conclusões até o momento, caso contrário cairia naquele lugar em que nunca vou terminar todo o conteúdo e meus insights ficariam guardados só para mim, perdendo portanto a parte mais legal de tudo que é justamente o compartilhamento e o debate de ideias.
Logo não pretendo aqui me colocar como dona da verdade, mas apenas compartilhar os insights que tive e abrir para discussão, o report está enorme e entendo que pode não ser o melhor formato a dividir quando consideramos as dificuldades da economia da atenção, mas agradeço se mais uma vez você dispuser do seu tempo por aqui.
Vou abrir muitas caixinhas mas prometo conecta-las no final, se de fato consegui aí é o seu feedback que vai me dizer.
Se puder dar uma sugestão, vá lendo aos poucos os tópicos, pois é muita informação e as vezes a cabeça da um bug e precisa de tempo para assimilar. Mas se você for mais parecido comigo reserve um tempo na sua agenda, pegue sua bebida favorita seja ela um café ou um vinho e vamos de uma vez só.
Ah! Caso você ache que esse report faz sentido vou amar se você me ajudar a compartilhar com seus clientes, fornecedores, equipes de trabalho e pessoas que acredita que vão se interessar pelo assunto.
Boa Viagem!
INTEGRAÇÃO E COMO TUDO ESTÁ RELACIONADO
A futurista Amy Webb é uma das palestrantes mais esperadas do SXSW já há alguns anos e iniciou sua apresentação em 2023 nos dizendo como hoje não temos apenas um ou outro interesse, não podemos mais avaliar as coisas separadamente e sim achar o fio condutor de como tudo se relaciona, tentemos então…
UMA ABERTURA INESPERADA
Confesso que fiquei um pouco curiosa quando vi que a palestra de abertura do evento seria com Simran Jeet Singh, autor de The Light We Give, um livro focado em desenvolvimento pessoal (amo que Dani Lee me ensinou essa expressão e acabou com meu preconceito com auto ajuda) e questionando porque o festival teria decidido uma temática como essa para iniciar. A palestra assim como o livro fala de como podemos achar a luz em meio a escuridão. Ele defende que quando surge o pior da humanidade também existe o melhor da humanidade, que quando nos juntamos existe sim uma saída para o mundo, que existem desafios sim, sem otimismo tóxico aqui, mas que sempre podemos juntos tirar coisas boas (fiquei pensando aqui no que aconteceu no litoral norte ao longo do carnaval...).
Singh apontou também que precisamos separa os atos das pessoas e quando alguém nos faz algo mal devemos pensar no ato em si e não estigmatizar a pessoa; e que a chave para conseguir fazer essa separação seria achar algum ponto em comum com aquele outro e isso faria com que a gente lide melhor com aquela situação (importante ressaltar que aqui não estamos falando de nenhum tipo de relacionamentos abusivos, ok?), mas isso seria inclusive uma ferramenta pra diminuir a polarização que vivemos, porque o que nos une seria mais forte do que aquilo que nos separa e portanto essa seria a saída para criarmos um futuro melhor para a humanidade.
De início essa abertura para mim ficou parecendo meio solta, foi só quando diversas pessoas que estava acompanhando começaram a apontar que o fio condutor, aquele lá que a Amy Webb se referiu, do evento esse ano era a palavra comunidade que essa abertura começou a fazer sentido para mim.
A palavra comunidade não é novidade no nosso vocabulário ainda mais pra quem trabalha de alguma forma com marketing. Acho até que começou a ser popularizada lá nos anos 2000 (que não por acaso estamos vendo de volta a moda) no Orkut, uma das primeiras redes sociais pela qual nos aventuramos.
Lembro que abordei o tema comunidade relativo a marcas no TCC do meu primeiro MBA em 2015 e concordo com os meus colegas que a palavra segue importante, mas gostaria de ir um pouco mais a fundo.
Pra mim o termo comunidade não pode mais ser dissociado de habilidades sócio emocionais, o que na minha opinião seria essa sim a grande temática da edição.
O EMBATE METAVERSO X CHAT GPT
Não podemos ignorar que até poucos meses atrás a grande incógnita tecnológica era o tal do metaverso. Zuckerberg na edição do ano passado do SXSW até palestrou sobre o assunto de maneira remota tendo há pouco tempo mudado o nome da empresa de Facebook para Meta. Esse ano no entanto a impressão geral é de que o metaverso acabou ficando ofuscado pelo Chat GPT e a discussão em torno de inteligências artificiais.
O FLOPE DO METAVERSO
Mas então o metaverso flopou? A resposta é não, ele apenas ainda não aconteceu.
Já temos vários mundos criados e ações sendo realizadas, que estão sendo possibilitados principalmente pelos profissionais das áreas de games e animação, dizem inclusive que grande parte da equipe que produziu Avatar está envolvida com a criação do metaverso. A principal dificuldade encontrada hoje é que esse mundos diferentes ainda não se conversam, então você ainda (foco no ainda) não consegue levar o seu avatar e as suas posses digitais de uma plataforma para outra. Quando isso acontecer aí sim vamos começar a sentir experiências cada vez mais imersivas, como quando viajamos para outro país mas ainda somos as mesmas pessoas, essa é a analogia principal.
Enquanto isso não acontece não há como negar que já exista um mercado de aquisições de bens virtuais, as tais das NFTs. Alguns ainda viram o olho para elas, mas em ativações de marcas em Austin pudemos observar que essas NFTs tanto tem sido pontos de partida para a criação de produtos reais, como um carro da Porsche que foi personalizado por um artista e depois transformado em edição limitada no mundo real ou como na produção de tecidos, estampas e peças de roupas do mundo virtual direto para impressoras 3D que as tornam reais. Mas também vemos como as NFTs tem desempenhado um papel na construção da palavra da vez, as comunidades, criando grupos de detentores de determinada NFT, como se fosse o seu cartão de um private club. Ativações de marcas específicas para quem investiu naquela aquisição e até possibilidade de ser um pequenos sócio de algo como pessoas que compram NFTs de seriados e com isso ajudam (ou seria investem?) para a realização de novas temporadas, podendo inclusive fazer participações como figurantes.
Joana Nolasco inclusive em um dos seus brilhantes e divertidos resumos dos eventos que participou ao longo do Festival abordou o fato do quanto a Gen Z e os Alphas já estão integrados a esse que ela chamou de 3º espaço. Ao serem literalmente enfiados em um ambiente 100% digital ao longo da pandemia, hoje esse ambiente é um local de conexão para essas pessoas, que não é nem a escola nem a casa, portanto o tal do 3º espaço, como costumava ser o encontro no shopping pra minha geração. Ela inclusive conta que um palestrante foi a uma sessão de cinema com seu avatar em um desses mundos virtuais e se deu conta que era o único assistindo ao filme, que os demais avatares estavam todos no lobby do cinema batendo papo e se conectando.
Podemos dizer então que embora o metaverso ainda não esteja 100% pronto ele já gera o sentimento de comunidade e promove interação entre os seus usuários além de um comércio próprio que talvez esteja se comunicando de maneira até mais efetiva com os seus consumidores, de uma forma muito mais engajada e menos transacional.
CHAT GPT: O QUERIDINHO OU VILÃO DA VEZ?
Uma das palestras sem dúvida mais esperadas desse ano era a do criador do Chat GPT, Greg Blockman, que nessas descobri que tem como sócio Elon Musk ( o homem literalmente está em tudo). No entanto o sentimento geral pelo que pude perceber é que Greg estava pouco preparado para responder aos questionamentos de sua ferramenta. Talvez não pudesse respondê-los, talvez não soubesse respondê-los , o que é o meu medo maior.
Fico me questionando se pessoas como Greg, gênios de tecnologias estão preocupados apenas em otimizar tudo ou se eles também pensam nos impactos que irão causar na sociedade? Seriam eles apenas variações de Sheldon Cooper no mundo atual?
Quando perguntado por uma pessoa da audiência que dado o nível de otimização da ferramenta o que ela deveria ensinar então a sua filha de um ano para que essa criança pudesse ter uma carreira no futuro a resposta de Greg foi que deveríamos ensinar as crianças a ter senso crítico para saber discernir as respostas corretas e com isso em mente fazermos melhores perguntas.
Quando lembro que em o dilemas das redes sociais descobrimos que os próprios criadores das ferramentas não deixam seus filhos usarem, fico pensando se Greg não avaliou ou se só não sabe o impacto dessa resposta. Até onde entendo o Chat GPT é uma inteligência artificial que faz a busca e nos retorna uma única resposta, as vezes muito assertiva, as vezes muito ruim, mas levamos em contar que a ferramenta ainda está aprendendo…mas o fato de termos uma única resposta como verdade absoluta é preocupante.
Diferente do google ao qual estamos habituados em que recebemos várias fontes diferente e podemos fazer nossa curadoria, ter uma única resposta traz o risco de tomarmos isso como verdade absoluta, não abrindo lugar para debate e pior podendo ser usado como ferramenta de manipulação já que não podemos assegurar que o dono por trás da ferramenta está deixando-a 100% isenta...já aprendemos isso como facebook e instagram, não?
Concordo com a importância de desenvolver senso crítico (não só para as crianças mas pra muita gente por aí), mas pensando que no mundo de hoje já conseguimos polariza-lo só com Fake News em imagens e textos será que estamos prontos para lidar com uma ferramenta ainda mais inteligente? Também apreendi um conceito novo durante as horas que passei consumindo conteúdo do SXSW e que me deixou imensamente assustada, o conceito de deep fake.
Deep Fake consiste em ferramentas que com 5 segundo de áudio e uma foto sua conseguem montar vídeos seus reproduzindo qualquer discurso, ou seja o futuro da fake news talvez esteja mais avançado que o nosso senso crítico para lidar com elas ou com qualquer ferramenta de Inteligência artificial, um grande embate em possibilidades X riscos da ferramenta que se o próprio criador não sabe responder, quem saberia? Afinal não podemos mais contar com o ver pra crer.
COMO FICAM OS CRIATIVOS NA ERA DA INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL
Desde que o Buzzfeed anunciou que tinha a intenção de gradualmente reduzir seu quadro de funcionários priorizando o uso de inteligência artificial para a construção de conteúdos temos visto a comunidade criativa se dividir quanto ao uso da ferramenta.
No podcast do Meio e Mensagem sobre o SXSW, a entrevistada Sumara Osório (Chief Strategy Officer da VMLY&R) que esteve pela 5 vez no festival reflete sobre o assunto nos dizendo que a IA nos poupa tempo para pensarmos em assuntos mais complexos mas que mais uma vez precisamos aprender a usar as ferramentas. Ao invés de começarmos a criar algo do zero podemos começar com um pouco mais de informação.
Os criativos não serão substituídos até porque como disse a COO da plataforma Reddit a IA precisa se alimentar de algum lugar (pelo menos por enquanto, não saberemos no futuro).
Sumara também defende que marketing, comunicação e publicidade muito pautado pelos dados já chegaram a um limite de quem tem mais dinheiro para ferramentas e para impulsionar posts, e que tudo que precisa de construção emocional precisa de pessoas que de verdade conhecem a humanidade.
“ A verdade é que a gente percebe que aquelas marcas que se direcionaram só para performance e esqueceram a construção da marca, do awerness, do engajamento, da consideração, etc, em algum momento elas precisam parar tudo e precisam começar a abrir o funil de novo, porque elas esgotaram todas as otimizações possíveis de serem feitas(...)e hoje está provado o ROI maior quando a gente constrói uma comunicação que tem earned media, que gera engajamento.” Sumara Osório no podcast do Meio e Mensagem
OS GURUS DAS TENDÊNCIAS
Pessoas que entendem pessoas sempre vão ganhar. Essa frase estava presente na apresentação de Rohit Bhargava, o dono e proprietário das tendências não óbvias cujo os livros sempre indico por aqui e também uma das palestras mais esperadas.
Rohit prevê que a IA criará uma onda de criatividade aumentada, na qual o ponto de partida é o potencial humano. A convivência com os devices são chave para melhorarmos a vida humana, inclusive cita que a maior contribuição da apple à humanidade foi o apple watch, que nos possibilita monitorar nosso corpo e prever indícios de doenças. (Um parênteses aqui porque com essa fala não consigo não me lembrar do livro Origem de Dan Brown, sim o cara do código da vinci, é uma distopia. Mas foi talvez o meu primeiro contato com IA e sinceramente pelo o que vejo nem é mais tão distopia assim. Se quiser uma leitura mais leve sobre o assunto sugiro a leitura e depois venha discutir comigo sobre o final do livro pra eu não dar spoiler por aqui).
Rohit também aponta uma tendência que chama de Unnatural Better, onde vamos começar uma busca por soluções não naturais. s tech foods já estão por aí pra nos provar isso e podem ser inclusive a solução para o problema da fome no mundo (o que é aliás bizarro pensar que estamos discutindo tanta tecnologia e ainda tem gente passando fome), também falou sobre órgãos artificiais que são desenvolvidos em impressoras 3D e transplantados para pacientes que necessitam, o que segundo ele já é uma realidade bem próxima.
Mais uma vez o saber fazer as perguntas certas foi levantado e o interesse nas pessoas como únicas ferramentas para fazer o homem dominar a máquina.
Amy Webb, mais uma guru das tendências que já falamos aqui, também foi enfática quando disse que a internet do jeito que conhecemos não existe mais. Enquanto antes nós buscávamos as informações online, na web3 é a internet que vai buscar coisas em nós. ( Aqui mais um parênteses porque é também impossível não citarmos Yuval Harari e seu 21 uma lições para o século XXI, livro que todo mundo deveria ler e que aborda a IA e qual a importância de conhecermos nossas emoções antes que a ela saiba mais as nossas vontades que nós mesmos).
Para Webb há um perigo de centralizar em poucas mãos todos esses dados coletados pela IA, já falamos disso né? E que o único jeito de fugir disso seria abrir a conversa para ouvir a todos e formar nosso senso crítico (olha ele aí de novo).
SAI O CONFLITO E ENTRA A COMPLEMENTARIEDADE DE GERAÇÕES
A questão de gerações sempre é tratada como caixinhas, mas esse ano foi a primeira vez que ouvi sobre a complementariedade delas. Muitas empresas tem se dedicado a entender a Gen Z (nascidos a partir de 97) e os Alphas (nascidos a partir de 2010), afinal essas gerações são os jovens da vez e portanto os ditadores das tendências de consumo atuais (caso você queira entender melhor o porquê sugiro assistir we all want to be young, vídeo antigo da box1824 mas que funciona bem até hoje).
No entanto, painéis no SXSW abordaram como já é uma realidade que a maioria de nós vai viver mais de 100 anos e pouco tem se olhado para esses mercados mais experientes (olha o oceano azul aí). Aqui, quando falamos em viver mais tempo estamos falando de viver também ativamente por mais tempo (daí também o boom de temas como saúde e bem estar dos últimos anos), para isso vamos prolongar nossa estadia no mercado de trabalho, tanto por questões financeiras como também para o nosso senso de propósito e comunidade (oi de novo), parar aos 60 anos e pensar em viver 40 anos na aposentadoria será um hábito cada vez mais raro; para isso vamos nos reinventando e a ideia é que vamos recomeçar muitas vezes e ao contrário dos boomers e seus 20 anos na mesma empresa a ideia e que daqui pra frente vamos ter na verdade é 20 profissões diferentes.
Os Gen Zs e Alphas por sua vez começam a chegar no mercado de trabalho. É verdade que nunca antes tivemos tantas gerações convivendo nesse espaço e cada uma com as suas demandas. Essas duas gerações já nativas digitais e habituadas a ambientes embriões do metaverso não demandam só por um conteúdo educacional que seja revestido de entretenimento (inclusive boa parte das startups selecionadas pra rodada de pitch acompanhada pela Gabriella Bordasch no evento tinham o futuro do trabalho e futuro da educação andando juntos como ponto em comum. Tecnologia sem foco em pessoas deixará de ter valor, plataformas que só entregarem produtivida, segundo ela ficarão no passado) mas também demandam seus espaços de creators e aceitam menos as coisas prontas, e o famoso é assim que é feito, afinal eles são criadores de espaços e conteúdos e tem exemplos próximos de quem consegue monetizar essas habilidades. Como de dará então esse convívio no mercado de trabalho ? Isso se é que eles vão querer seguir as profissões tradicionais e não criar suas próprias.
A ideia apresentada é que ao invés do conflito de gerações vamos passar a buscar a sua complementariedade. Os jovens tem diversas informações a disposição e podem aprender qualquer coisa na internet, inclusive agora via chat GPT, mas vão precisar de mentores nas habilidades sócio emocionais, habilidades que não estão na internet. A famosa experiência de vida e repertório que só a interação com os mais velhos permite. As gerações mais velhas por sua vez vão precisar desse conv´vio para se manterem atualizadas sobre as novas tecnologias, desse modo essas complementariedade de tarefas, além do falado senso de comunidade, nos apresenta pela primeira vez um exemplo de furar a bolha e trabalhar em conjunto com o diferente, juntando um ecossistema ideal com a ousadia jovem aliada a experiência do qual eu acredito que grandes coisas podem surgir.
CAIMOS DE NOVO NO STORYTELLING
Impossível não citar Yuval de novo quando pensamos storytelling. Em seu livro Sapiens (eu sei que é custoso mas garanto que vale a leitura) o autor defende que a humanidade só evoluiu a partir da habilidade de contar histórias.
Nesse ponto acho que quase todos concordamos que uma das empresas mais bem sucedidas em contar histórias é a Disney.
Josh D’Amaro, presidente do setor Disney Parks, foi um dos palestrantes do SXSW desse ano e trouxe uma série de inovações tecnológicas nas quais a empresa onde os sonhos se tornam realidade está trabalhando. Desde um holograma com a Sininho, fada de Peter Pan, até sabres de luz reais de Star Wars. No entanto deixou claro que embora a empresa esteja atenta à tecnologia a base de tudo ainda é human made e o objetivo principal é gerar emoção, ou seja conexão.
Outra palestra muito esperada foi a de Ryan Gellert, CEO da Patagonia, empresa focada em esportes outdoor e com grande foco em sustentabilidade. Quando digo grande foco estou falando de uma empresa que em setembro de 2022, em seu aniversário de 50 anos de marca, foi doada pelo seu fundador para um fundo especialmente projetado e uma ONG, ambos ligados a questões climáticas. Estou falando de destinar 100% do lucro da empresa para uma causa global e que atinge a todos nós, levando a um outro patamar a métrica dos 4Cs tão almejada hoje por quem trabalha na área de marketing (Commerce, Comunidade, Construção de Cultura e Conteúdo) e também o ganha – ganha – ganha dos 3Ps (Planeta, Profit e People). Ryan inclusive ao comentar essa decisão da doação, afirma que antes havia uma discrepância entre o posicionamento da marca e como ela lidava com os lucros. O branding que admito não é para todos, mas elevado a sua máxima.
Ryan ainda explorou o fato das lojas da Patagonia oferecerem espaços destinados a produtos 2nd hand e reparos das próprias peças. Segundo ele não podemos considerar que podemos comprar só pensando em doar, aliviando assim a nossa consciência de consumo desenfreado; mas sim entender a verdade por trás do nosso processo de consumo. Em uma das ativações da marca que mais vi divulgada no SXSW também adicionou que ativações quando bem feitas geram memórias e portanto emoção (ela de novo).
Falando em emoções, a palestra que talvez mais tocou as pessoas esse ano foi a do chef e ativista espanhol José Andrés, fundador da World Central Kitchen, uma ONG de cozinha humanitária que se dedica a levar refeições para áreas em situação crítica, já tendo passado pela Síria, e recentemente pelo terremoto da Turquia e a guerra da Ucrânia.
José Andrés levantou a importância de contar e escutar histórias. Contou um caso de quando esteve no Haiti em que seu feijão não agradou as pessoas, logo ele um chef com estrela Michelin, e ao conversar com as mulheres descobriu que o feijão naquela região era feito de uma outra forma e assim foi aprender com os locais como fazer da forma que eles iriam gostar. Para ele a primeira coisa que temos que fazer na filantropia é escutar a história de quem irá receber para fazer aquela ajuda de fato ser efetiva, pois as pessoas não precisam da nossa pena mas sim do nosso respeito. ( Aqui peguei a indicação do documentário We Feed People que conta um pouco do dia a dia da World Central Kitchen.)
Abordando a importância do coletivo ouvimos sobre o clubes de compras na China, o que no Brasil já observamos pelas startups de mercados on line como Justus e Shopper que ao terem a lista fixa dos produtos que seus clientes querem conseguem negociar melhores preços. Mas também vemos muito essa virada de chave no mercado editorial, jornalistas cada vez menos dependentes de propagandas e patrocinados pela sua audiência, possibilitando conteúdo isento e muito benéfico em tempos de fake news ( Oi Substack! Falamos sobre isso na nossa primeira news aqui).
Em mais um painel destinado a storytelling, discutiu-se como estamos desesperados por novas histórias, já que no entretenimento temos vivido muitos spin offs e reedições, no entanto o cenário de conteúdo abarrotado e a guerra por atenção e os algoritmos tem tornado cada vez mais difícil a criação de novas narrativas, algo para questionar se não estamos vendo sempre mais do mesmo reforçando nossos padrões e não abrindo espaço para o novo.
PSICODÉLICOS: A BOLA DA VEZ
Quando pensamos que o SXSW acontece nos EUA não faz mais sentido falarmos de cannabis, dado que muitos estados já legalizaram a substância, sendo assim os psicodélicos tem sido os queridinhos do momento. Ano passado houve o boom do livro do jornalista Michael Pollan intitulado Como Mudar Sua Mente, que inclusive virou série no Netflix.
Ao longo do livro Michael, que até então era um jornalista focado em gastronomia, vai a fundo entender os estudos que estão sendo feitos com psicodélicos e como essas substancias tem ajudado as pessoas a curar depressões , recriar padrões e tratado suas questões mentais.
Pensando que levantamos até aqui assuntos como, senso crítico, emoções, comunidade, conexões, empatia, acredito que o boom dos psicodélicos não é a toa, já que vivemos em uma sociedade hoje altamente ansiosa, doente e polarizada, e em alguns muitos casos depressiva pelas comparações. Se essa é a porta para nos curarmos ( e em alguns casos ainda sustentável e acessível, será que é a natureza nos salvando mais uma vez mesmo enquanto destruímos ela? ), talvez valha abrir as portas ( com responsabilidade é claro) para essas novas ferramentas que nos ajudem a lidar melhor com as nossas novas questões que são recentes já que a internet começou a pouco mais de 30 anos e para as quais não fomos preparados para lidar.
Em tempo o autor best seller e médico Deepak Chopra também participou de um painel sobre psicodélicos no qual afirmou que não precisava mais usá-los, pois hoje é capaz de chegar ao mesmo lugar com a prática da meditação, assunto que vem ganhando cada vez mais espaço e tem estado sempre no nosso radar.
SXSW 2023: CONECTANDO OS PONTOS
A edição de 2023 do SXSW não trouxe o lançamento de nenhuma grande nova tecnologia como nos anos anteriores. Para muitas das pessoas que acompanhei o consenso geral foi que o evento desse ano não trouxe nem respostas, mas sim muitos questionamentos de como vamos nos comportar com a inteligência artificial e seus desdobramentos.
Eu particularmente fiquei com a sensação de que alguns pontos de vista foram pouco explorados. Muito se falou em senso de comunidade e conexões, que acho que são realmente o caminho e defendo muito principalmente para a esfera das marcas sejam elas pessoais ou comerciais, mas senti falta de explorarem como faremos para furar a bolha dessas comunidades que por vezes ficamos tão apegados.
Temos alternativas como ouvir a história do outro, tentar o uso de psicodélicos, a meditação para tentarmos abrir um pouco mais a mente, mas em um mundo ultra polarizado e em uma era de pós verdade que vivemos e observando uma nova tecnologia que vem com tudo por aí e pode ser a nova dona da razão, falar apenas em ensinar senso crítico acho pouco, já que isso é uma esfera muito individual e já observamos que não tem sido tão eficaz.
Talvez a questão não tenha sido tão levantada por não ser um ano de eleições nos EUA, mas volto a dizer que mais que comunidade, pra mim o grande ponto é passarmos a questionar e investir em melhorar as nossas habilidades sócio emocionais. Me pergunto o quanto esses criadores de novas tecnologias, o quanto as marcas, o quanto os empresários estão preocupados também em alinhar tecnologia como nosso lado humano para de fato convivermos bem com a máquina.
Dois fatos curiosos me chamaram atenção, o primeiro veio de uma reflexão de um texto do Cris Dias, que traz a nossa pressa em monetizar tudo. Nas palavras dela talvez a IA seja uma das maiores revoluções da história da humanidade e ao invés de estarmos discutindo os impactos positivos e negativos logo nos voltamos a como rentabilizar os business, prova disso foi a palestra de seu próprio criador considerado um tanto despreparado para responder as questões sobre seu próprio trabalho em um evento dessa magnitude.
O segundo fato foi que bem na semana que o SXSW começou tivemos a quebra do Silicon Valey Bank, grande responsável por possibilitar o surgimento de diversas startups e quase nada se falou sobre o assunto. As inúmeras demissões em massa (chame do nome bonitinho de layoff se quiser) que atingiram as empresas de tecnologia também não foram abordadas, e nesse sentido faço minhas as palavras da Carla Purcino: “Como podemos falar de futuro se estamos anestesiados com o presente? “
Há de certo uma crise de governança nas empresas seríssima, e como assistimos a tanta inovação enquanto vivemos mais uma crise de má gestão sem discuti-la ? (nem vou falar em Americanas, falamos numa news do passado já, clique aqui para conferir).
Em uma dos painéis sobre viagens espaciais uma das palestrantes levantou um ponto em comum a todos os astronautas, o tal do Earth Viewing Effect, que segundo ela todos eles passam. É uma mudança de percepção que astronautas vivem quando se vem no espaço e olham pra Terra, um senso de quão interligado tudo está, de integração do planeta e de quão pequemos somos e o quanto só fazemos sentido se fizermos parte do todo. Talvez essa seja a habilidade sócio emocional mais importante que deveríamos desenvolver, talvez nossa comunidade tenha ficado um pouquinho maior do que aquele nicho de mercado que queremos monetizar. Será que todos teríamos que ir para o espaço e ter ideia da nossa pequenez frente ao todo para desenvolver esse tal de senso crítico?
Talvez essa seja a pergunta certa que a IA não é capaz, ou não está interessada em responder, e que nos faça conviver com ela em busca dos benefícios e não escrava dela como temos feito com as tecnologias até então. Eu espero que as mentes certamente privilegiadas que estiveram em Austin (sobretudo os inúmero brasileiros) que desenvolverão novos negócio sejam sensíveis a isso e de repente aquela palestra de abertura meio estranha faz sentido, qual a luz que vamos dar a essas questões?
Posso ter sido um tanto Poliana na minha conclusão, mas me permita citar Rohit novamente antes de finalizar, só podemos criar um futuro melhor se fomos capaz de imaginá-lo.
Pra Ficar de Olho:
Aqui a Lista de Pessoas que acompanhei para esse report e que merecem todo o meu crédito:
- Oxygen
- Gabriella Bordasch
- Agência PROS
- Fernando Luna
- Renata Feltrin
- Monica Magalhães
- Ale Garattoni
Por Fim
Ainda em tempo, minha ideia não era abrir uma assinatura no substack nesse momento, mas tendo em vista o imenso tempo dedicado a construção desse report vou passar o chapéu para mim mesma aqui e se você sentir que seu tempo valeu e quiser contribuir como o meu hobby/trabalho, basta clicar no botão abaixo, terá toda a minha gratidão por esse reconhecimento, me incentivando inclusive a produzir cada vez mais conteúdos nesse sentido.
Esse report deixei em aberto mas a ideia dos próximos seria uma edição exclusiva para assinantes.
Aproveito pra me colocar a disposição também caso você queira me patrocinar para conseguir ir ao SXSW no próximo ano. Quem sabe não faço um material exclusivo para o seu business? Me chama clicando aqui para um café e falamos!